domingo, 29 de junho de 2014

Aluno, mercado e falácias


“Estamos todos matriculados na escola da vida, onde o mestre é o tempo”.
Cora Coralina (1889-1985)

A Educação Superior Brasileira nunca esteve tão populosa como nestes tempos pós-modernos. Houve um grande número de abertura de Faculdades nas duas últimas décadas e o resultado foi à inserção de pessoas neste novo filão de mercado chamado Educação Superior Privada – afinal se tornou extremamente rentável abrir faculdades, principalmente pelos padrões brasileiros, isto é, baixa remuneração do professor, salas superlotadas e educação infantilizada. E, por mais que a grande maioria das Faculdades ainda esteja arrolada como “privada sem fins lucrativos”, no item “categoria administrativa”, conforme exposto no site do Ministério da Educação (MEC – www.emec.mec.gov.br), é preciso que se faça uma reavaliação de nomenclaturas e definições designadas pelo Governo. É preciso reconhecer que nestas “Empresas Educacionais” há lucro, não superávit.

No mesmo nível das mudanças estruturais capitalistas em que as Faculdades Brasileiras vêm passando, o perfil dos egressos também foram sofrendo mutações. O aluno de Instituição Superior Privada não mais é visto como acadêmicos, mas sim como clientes – demonstrando que as relações primordiais destes agentes educacionais se dão pela troca financeira, não pelas vias do conhecimento teórico ou da pesquisa. Razão esta que reprovar aluno nas “Empresas Educacionais” não é algo bem visto. Reprovação de aluno significa perda de receita, pois provavelmente este aluno preferira se mudar de faculdade, já que no mercado há tantas opções interessantes e interessadas. Significa também má reputação da Faculdade, pois o aluno reprovado tende a depor contra a Instituição, deprecia-la publicamente e dramatizar uma perseguição educacional nas redes sociais. Enfim, aluno se tornou cliente, e cliente sempre tem razão, como já dizia o senso comum.

O resultado mais estranho da relação cliente-aluno e educação-capital, é que para manter esta fantasia pós-moderna é preciso ludibriar os alunos e faze-los acreditar que há mercado para todos os concluintes da Educação Superior. Nada é mais mentiroso que tal postulado. O mercado tende ao acumulo de capital, restringindo profissões e relegando a maioria a atividades mecânicas e desprovidas de conhecimento acadêmico. O mercado é volátil e de tempos e em tempos reconfigura o que se dá dinheiro, as profissões e as funções. De contrapartida as Faculdades são lentas em oferecer cursos atualizados, então, o que se tem é uma maré de gente se formando em algo que o mercado não vai absorver. Para não desmotivar os infantis alunos da Educação Superior criou-se a “lenda maior” que afirma: se o aluno se esforçar vai conseguir, só depende de você. A realidade é que tal proposta tira toda responsabilidade do fracasso educacional dos ombros das Faculdades e joga-o sobre os ombros dos alunos.

Num cenário educacional-capitalista com tamanhos disparates conceituais, surge aquela que pode ser considerada a falácia mater que é acreditar que o mercado vai diferenciar os alunos bons dos maus, então, não é responsabilidade da Faculdade faze-los na formação acadêmica. Isto sim é fantasioso e no mínimo contraditório. Acreditar que o mercado tenha competência para julgar os conhecimentos adquiridos durante a formação teórica do aluno é não entender como funciona o mercado. Para as empresas, de uma forma geral, conhecimento é importante, mas esperteza, criatividade, empreendedorismo e liderança são mais importantes – e tais distintivos não se aprendem nas salas de aulas, por mais que se tenham disciplinas com tais nomenclaturas. O mercado sabe que notas e diplomas não revelam quem realmente são os alunos, portanto, o mercado ficará com aqueles que farão a empresas serem mais lucrativas, o que se fez no tempo de Faculdade não tem relação alguma com isto, infelizmente.

Por tudo que fora escrito nos parágrafos anteriores podemos asseverar alguns postulados que podem ajudar os alunos da contemporaneidade: 1) Não faça Faculdade pensando em ganhar dinheiro – o dinheiro não é fruto do esforço; 2) Não escolha o curso pelo retorno financeiro que pode oferecer – o mercado muda rapidamente; 3) Não acredite que se você for esforçado vai dar tudo certo – coisas ruins acontecem com gente boa, e vice-versa; 4) Não faça provas e atividades escolares pensando na nota – nota é apenas uma besteirinha que precisamos ter para fingir que sabemos mensurar o conhecimento; 5) Não desperdice seu tempo fazendo trabalhos acadêmicos ruins – isto só te desmotiva na busca por conhecimento; e, 6) Não acredite que a Faculdade vai te ensinar tudo que você precisa para ingressar no mercado – as empresas e as Faculdades não comungam do mesmo dialeto.

Assim e simplesmente,
Vinicius Seabra | vs.seabra@gmail.com
[escrito em 29 de Junho de 2014]

sexta-feira, 6 de junho de 2014

Copa do Mundo: não sou contra, nem a favor, muito pelo contrário


“...A escola não ensina, a igreja não catequiza, os partidos não politizam. O que opera é um monstruoso sistema de comunicação de massa, impondo padrões de consumo inatingíveis e desejos inalcançáveis, aprofundando mais a marginalidade dessas populações”
Darcy Ribeiro (1922-1997)

No prelúdio da Copa do Mundo no Brasil (2014) percebe-se que o povo brasileiro ficou confuso (ou pelo menos se reconhece hoje a confusão ideológica, prática e paradigmática de ser brasileiro). Quando o Brasil foi escolhido para sediar o Mundial (31 de Maio de 2009) todos celebraram o feito, não há nenhum registro oficial de opinião contrária, o povo apoiou a ideia de o Brasil sediar a Copa – todos nós brasileiros sabíamos que haveria desvio de verba, pois corrupção e malandragem nunca foi novidade em solos tupiniquins, especialmente entre os políticos e donos do capital.

Os anos se passaram e o óbvio, o lógico, o previsível, o inevitável, aconteceu: superfaturaram as obras da Copa do Mundo. O resultado foi uma maré de brasileiro que saíram as ruas (meados de junho de 2013) para “desfilarem” suas supostas indignações. Agora todos os brasileiros (exceto os políticos aliados ao PT e as empresas que ganharam as licitações da Copa) eram contra a Copa do Mundo e “apresentavam” um alto índice de percepção crítica coletiva sobre educação, saúde, segurança e economia global – a bem da verdade as manifestações foram mais um desabafo de fúria desprovido de intencionalidade do que um processo de reivindicações coletivas para a nação.

Um ano se passou (meados de junho de 2014) e agora os brasileiros se encontram numa situação constrangedora e contraditória, sutilmente se percebe um reapaixonar do povo pela Copa (ainda envergonhado, acanhado, mas vívido) – a história se repete: os mesmos que gritavam Hosana para saudar Jesus, foram os mesmos que gritaram “crucifiquei-o”, e foram os mesmos que se vislumbram/encantaram com a ressureição do Mestre. Então, descortina nossa mais vil debilidade: nossa brasileiraridade. Que permiti afirmar: Copa do Mundo - não sou contra, nem a favor, muito pelo contrário!

Deste emaranhado de paixões e raivas que orbitam no epicentro da nação brasileira é válido arrazoarmos sobre alguns aspectos: 1) A Copa do Mundo é antes de qualquer coisa um jogo político-capitalista – não se iludam navegantes tupiniquins, a escolha do Brasil como sede para o Mundial não foi realmente uma “escolha”, mas sim uma estratégia politica para acumulo de capital. Em tempos de crise mundial só nós brasileiros toparíamos investir bilhões em entretenimento e desviar verbas descaradamente. 2) Ganhar ou perder a Copa do Mundo não é uma questão de seleção de jogadores – não sejamos ingênuos indígenas, tudo já está arquitetamente vendido, algo tipo aquelas lutas livres que assistia na minha infância. Não existem jogos (de qualquer gênero) que não seja passivo de manipulação dos resultados, ainda mais no Brasil.

Há mais algumas considerações que precisamos ser sinceros: 3) Os brasileiros não são pessoas com senso coletivo – não se alucine, óh grande nação, as manifestações (2013) apenas provaram o quanto temos dificuldade de organizar reivindicações para o bem coletivo. E ao contrário do que se divulgou, afirmando que os tempos pós-modernos se caracterizam por diversidade e pluralidade, não se pode esquecer que também vivemos na época de uma indivisível individualidade. 4) A corrupção não é luxo dos políticos e donos do capital – não sejamos desatento quanto aos espelhos, desde mui pequenos aprendemos a nos beneficiar as custas das perdas dos outros. A ética brasileira é de gênero duvidoso.

Copa do Mundo! Contra ou a favor? Isto realmente não importa. O que se pode pressagiar é que: a Copa vai acontecer, e os desvios de verbas vão continuar nos hospitais, escolas, viadutos, metrôs e no carnaval; o povo brasileiro vai parar para ver o jogo do Brasil, e depois vão continuar a discursar suas homilias de pesudo-intelectualidade sobre a corrupção, moral e civilismo. Enfim, precisamos realmente mais do que Copa, mas também precisamos mais do que hospitais, escolas, transportes e aeroportos – precisamos de consciência, honestidade, caráter, seriedade e comprometimento (valores não tangíveis, e talvez por isto, não reivindicados).

Que venham as Olimpíadas 2016 - que não sou contra, nem a favor, muito pelo contrário!

Assim e simplesmente,
Vinicius Seabra | vs.seabra@gmail.com
[escrito em 06 de Junho de 2014]