“A pobreza antes era considerada obra de
injustiça. O mundo moderno considera a pobreza incapacidade”.
Eduardo Galeano (1940 - )
A pobreza, atualmente, tem se tornado sinônimo de ausência de
virtudes individuais, promiscuidade, vadiagem, incompetência, preguiça,
criminalidade e vagabundagem. Esta é uma concepção malthusianista (Thomas
Malthus, 1766-1834) que defendia que o pobre é pobre por causa de si mesmo,
pois não tem determinação (iniciativa), força de vontade e vive de forma
desiquilibrada - especialmente no quesito sexualidade, gravidez/natalidade (SCHWARTZMAN, 2004).
Ser pobre, no presente contexto histórico, é encontrar-se de forma
análoga com as mazelas da sociedade capitalista. Estar em estado de pobreza é
descobrir-se desumanizado (não cidadão). Entretanto, nem sempre fora assim. A
figura do pobre antes do século XVI agregava outras percepções conceituais e
políticas, eram outras as construções sociais e fraternas a partir da
representação da pobreza.
Reforçando a atual concepção de pobreza ALBERT (1992, p. 17 e 18)
pondera: “O que é um pobre? Na maioria das sociedades humanas e das épocas da
História, o pobre tem sido, com grande frequência, tratado como um coitado, um
inútil, um fracassado, um preguiçoso, um suspeito, e até mesmo um culpado.
(...) É possível que uma certa tradição européia considere o pobre mais como
vítima do que culpado, e isto, numa percepção multidimensional onde se somam a
ignorância e a indigência, a desesperança pessoal e a impotência social”.
A deformidade atual na concepção de pobreza e suas derivações não
se deram de forma espontânea, foram provocadas, especialmente por dois
movimentos históricos a partir do século XVI (DOWBOR, 1994), a saber: 1) A
consolidação do Capitalismo como forma de Governo/mercantilização; e, 2) Os
impactos da Revolução Industrial nas relações de trabalho e urbanização. Da
transição do Capitalismo Industrial (XVII
e XVIII) para o Capitalismo
Monopolista-Financeiro (XIX e XX) percebe-se o entrelaçar histórico do
Capitalismo e a Revolução Industrial – fato este que corroborou para mudanças
sociais.
O Capitalismo tem sua forma embrionária entre os séculos XIII e
XIV, especificamente com o surgimento da burguesia - nova classe social que
almejava lucro por meio das relações comerciais, sendo estes os possuidores de
riquezas e dos meios de produção. Contudo, apenas séculos depois o Capitalismo
se estabelece como forma de Governo, a partir da queda do feudalismo e, o
então, fortalecimento da industrialização - produção, relações comerciais e
lucratividade (HUNT e LAUTZENHEISER, 2013).
Os principais autores que perceberam (e idealizaram) esta nova
forma de Governo (capitalista-liberal) foram, entre outros: John Locke
(1632-1704), François Quesnay (1694-1774) e Adam Smith (1723-1790).
Posteriormente, tal sistema fora criticado e denunciado por Karl Marx
(1818-1883). A proposta capitalista-liberal defende o Estado Mínimo - redução da intervenção do Governo nas relações
mercantis e econômicas, o que favoreceu a desigualdade empresarial e a
exploração do trabalhador, o Livre
Mercado - ampla concorrência e competitividade, o que desprestigiou os
pequenos produtores/comerciantes e forçou a venda de mão-de-obra como forma de
subsistência, e, Individualismo -
valorização dos interesses pessoais e capacidades individualizadoras acima da
coletividade, o que desestabilizou as relações sociais.
A Revolução Industrial (1760-1914, data final aproximada)
aconteceu simultaneamente ao processo de consolidação do Capitalismo como opção
de Governo (gestão estatal e mercantil), especialmente pelos países ocidentais.
As consequências da Revolução Industrial foram devastadoras no quesito social,
porém oportunas para o acúmulo de capital. A precarização das condições de
vida, do intelecto e do trabalho facilitou a exploração da classe, doravante
denominada, operária. O surgimento do operário fez com a figuração do salário
aparecesse e se estabelece de forma relacional com o capital. Sendo assim, os
salários eram baixíssimos devido às condições de inchaço populacional,
qualificação profissional e demanda, o que oportunizou o acumulo de riqueza
pelos donos das industrias/comércios e condicionou socialmente os indivíduos a
uma forma de relação social individualizada (GIANNOTTI, 2007).
A Revolução Industrial extinguiu o trabalho artesanal, sendo assim
o trabalhador não mais detinha o conhecimento sobre o processo produtivo,
limitando-se a uma fração da cadeia produtiva, perdendo a noção de identidade
produtiva. Outro problema foi o aglomerado de cidadinos que se amontoaram nos
centros urbanos a procura de emprego, submetendo-se a condições de vida
precárias e desumanas. E, então, houve uma crescente exploração (escravidão)
dos trabalhadores por ocasião da iminente situação econômica dos
proletariados/operários.
O novo mundo advindo do
Capitalismo e da Revolução Industrial fomentou a migração de pessoas a procura
de empregos, fazendo-os abandonar suas terras (quase sempre contexto rural),
perdendo suas identidades culturais e sociais. Isto fez com que houvesse uma
demanda de pessoas superior à demandada de empregos, gerando marginalização,
pobreza e subemprego (posteriormente emprego informal). Nestas condições o
trabalhador, antes rural agora urbano, não detinha conhecimentos conceituais,
apenas técnicos de produção agrícola, que no presente contexto tornou-se inútil
por ocasião das máquinas (produção industrializada). Isto favoreceu a exploração
dos operários e salários baixíssimos.
Da fusão Capitalismo e Revolução Industrial o trabalhador perdeu a
noção de fraternidade, outrora existente no contexto pré-industrial (ou no
comunismo primitivo). Isto se deve ao fato de que a precarização da vida do
operário o tornou homo economicus –
condicionando a ação humana, exclusivamente, a recompensas e sanções
econômicas. Sendo assim, as pessoas estavam mais preocupadas com o sustento
individual do que com as relações sociais (e o contexto social que estavam
inseridos), impedidos de visualizar a pauperização coletiva dos mesmos.
Endossando tais premissas de pauperização NETTO (2010, p. 40, 41,
45, 47) reitera: “As indústrias se expandem, mas simultaneamente ocorre um
processo de pauperização da população, com aumento descontrolado da mendicância
e dos trabalhadores empobrecidos e socialmente desprotegidos (...) com a
dissolução dos feudos, da vassalagem, imensos contingentes é expulso das
terras, sem direitos... (...) A pauperização do trabalhador empurra, para o
mercado produtivo, mulheres e crianças em terna idade, cujo envolvimento na
luta pela sobrevivência não é suficiente para a reprodução digna da vida
humana. (...) O processo de organização do trabalho do capital tem por
finalidade última a expansão e a concentração do próprio capital...”
A desestabilização social, econômica, agrária, educacional e
produtiva fez surgir, inevitavelmente, a figura do pobre como se concebe na
atualidade. Dando a entender que pobreza é um desarranjo social com implicações
apenas individuais (força de vontade, pensamento positivo, motivação pessoal -
concepção malthusianista). Ignorando toda a abrangência coletiva que a temática
pobreza circunscreve. Transferindo toda a culpa da pobreza para a zona do
individualismo do próprio pobre, ignorando que o pobre exista a partir de uma
realidade coletiva (interacionista).
A presente concepção de pobreza associada à ausência de virtudes
individuais, promiscuidade, vadiagem, incompetência, preguiça, criminalidade e
vagabundagem são recortes contemporâneos (últimos quatro séculos) daqueles que
ignoram a pobreza como fator sociológico, antropológico e histórico. Tais
desvirtudes, sumariamente citadas anteriormente, existem efetivamente no
contexto da pobreza, apesar de não ser um estereotipo totalizador, nem de
representação de classe. Contudo, tais desvirtudes não se deram ao acaso, foram
provocadas intencionalmente. Construir a classe social dos pobres seria
oportuno para o estabelecimento do Capitalismo e da Revolução Industrial.
Há pobres, na concepção descrita anteriormente, pois estes são
necessários ao sistema econômico vigente. É necessário que haja desempregados
para manter os salários dos empregados sempre baixos - Marx chamou este intento
de exército de reserva do trabalho (HARVEY,
2005). É necessário que haja distanciamento do local de trabalho com relação ao
local de moradia para que os indivíduos sejam estimulados a perder a noção de
sujeitos sociais coletivos – perdendo, gradativamente, as características
próprias/especificidades proletárias (HOGGART, 1973). É necessário que haja
relações de consumo e endividamento (parcelamentos, crediários) para que o dinheiro
se multiplique por meio dos juros (acúmulo de capital). Tudo isto endossado
pela influência da mídia para condicionar os trabalhadores à aceitação das
mudanças sociais e econômicas, como denuncia HOGGART (1973).
Há pobres, como se descreve na atualidade, pois estes figuram
(estereotipadamente) o papel de criminosos que perturbam a ordem social
pré-estabelecida, portanto, precisam ser marginalizados (afastados, recluídos).
Contudo, tal percepção de desordem é constituída, intencionalmente, com fins a
desconstruir as relações sociais com o referido pobre. Isto é notório, pois ter
medo (ou preconceito) do pobre o coloca em zona de desfiliação (CASTEL, 1998) e desfiguração social, distanciando-o
dos grupos sociais, rotulando-o de desordeiros e impedindo-o de refletir sobre
sua real condição – é a criminalização da pobreza (TELLES, 2001; ZALUAR, 2004).
O pobre para os padrões contemporâneo é uma massa de modelar,
inserindo-o (incluindo-o) precariamente na sociedade (MARTINS, 1997), que tende
a adequar-se aos interesses do capital, mesmo que estes não percebam e/ou não
queiram. Ser pobre, nesta concepção moderna, ao contrário do que se apregoa por
causa das suas desvirtudes, é um fetiche
do capital, que se dá ao luxo de oprimir a classe operária sob a ilusão de
ascensão social. Pobre é estado oportuno para que haja acumulo de capital, de
outrem. Ser pobre nos padrões atuais é encontrar-se em processo de
não-cidadania (TELLES, 2001). Contudo, nem sempre fora assim, ser pobre, antes
do século XVI, valia-se de outras representações, interações e intenções.
A figura do pobre (pessoa desprovida de) sempre existiu deste os
primórdios das civilizações, entretanto, o que vem se modificando ao longo dos
tempos é a forma de representação social (sujeito de direito, interação
coletiva, estereótipo social e representatividade grupal). O pobre é um ser em
estado de mutação permanente, assim como as sociedades o são. Desta forma, as
transformações histórico-sociais afetam diretamente na subjetividade da concepção da pobreza (CASSAB, 2001).
Na antiguidade teocêntrica o pobre era visto como estado
definitivo a partir da vontade divina. Surge a concepção de que quem nasceu
numa condição de vida desfavorável foi porque Deus assim o quis, igualmente,
quem nasceu numa condição favorável foi, também, por vontade divina. Desta
maneira o ser pobre era um estado aceitável socialmente (MOLLAT, 1989; REZENDE
FILHO, 2009). A pobreza não era vista como um estigma de desvirtude, mas sim
uma condição de vida proposital.
A concepção de que Deus quer
que haja pobres fomentou diversas ações da religiosidade. Era necessário
encucar nos pobres a ideologia de seu papel social na pobreza. Para tanto, os
pobres serviram como recipientes da caridade da igreja, da monarquia e de
movimentos religiosos em geral (REZENDE FILHO, 2009). A religiosidade ao mesmo
tempo em que acomodava o pobre no estado de pobreza, intermediava os donativos
dos favorecidos financeiramente, criando uma rede de assistencialismo e
comodismo social.
Enfrentar a pobreza em tempos teocêntricos era enfrentar Deus
(leia-se Igreja Católica). Desta forma, o que restava ao pobre era aguardar a
intervenção divina, que se dava na ação eclesiástica. Sendo assim, a figura do
pobre era internalizada com extrema naturalidade - paisagem (SUSSEKIND, 1990; TELLES,
1993; TELLES, 1998; FELTRAN, 2005), tanto pelo pobre, como pela igreja.
Se havia pobres, então, havia igreja – as duas vertentes se complementam
(CASTEL, 1998). Para que esta corrente de caridade permanecesse era
imprescindível convencer os ricos de contribuírem na igreja e esta por sua vez
orquestrar os repassem aos desafortunados.
A economia da salvação
(CASTEL, 1998) se estabelece a partir da premissa que Deus escolheu fazer
alguns pobres e outros ricos. Isto para que através do compartilhar os ricos
pudessem redimir de seus pecados (concepção errônea e anti-bíblica, mas
fortemente difundida na época medieval para ratificar a obtenção da salvação
por meio das esmolas). Sendo assim, endossa CASTEL (1998, p. 64 e 65):
“...estabelece-se um comércio entre o rico e o pobre, com vantagens para as
duas partes: o primeiro ganha sua salvação graças à sua ação caridosa, mas o
segundo é igualmente salvo, desde que aceite sua condição. (...) ...o pobre
pode, não obstante, ser instrumentalizado enquanto meio privilegiado para que o
rico pratique a suprema virtude cristã, a caridade...”.
O abastado, assim como o pobre, era estabelecido por vontade
divina, cabendo a ambos cumprir seu papel social. O rico partilhava de sua
riqueza (por meio da igreja) e o pobre era o receptáculo das caridades. Desta
forma a sociedade se “ajustava” coletivamente. Como assegura REZENDE FILHO
(2009, p. 3): “Os pobres adquirem, na ótica cristã do período, um caráter de
funcionalidade: sempre devem existir pobres, para que os ‘não-pobres’ possam
assisti-los, qualificando-se como bons cristãos”.
O problema é que passados alguns séculos os detentores do capital
não mais queria dividir suas riquezas com o pobre, nem deixar a igreja ser a
intermediaria deste processo “solidário”. Neste ínterim, o teocentrismo
enfraquece (razões principais: corrupção interna, má utilização dos recursos,
acumulo de riquezas, doutrina ultrapassada, iluminismo, racionalismo),
desnudando uma ruptura gigantesca entre igreja e Estado (e a burguesia).
A monarquia (e a classe emergente de burgueses) queria se libertar
da obrigatoriedade da igreja em ajudar os pobres, portanto, romperam com a
igreja e criaram Estados independentes da religiosidade (ou criaram
religiosidades próprias, equivalentes aos interesses do momento). Sendo assim,
o Estado, não mais a igreja, se relacionaria com o pobre, rompendo definitivamente com a intermediação
eclesiástica. Surge neste momento histórico as políticas públicas
governamentais de assistencialismo social.
O Estado, agora detentor da responsabilidade da ordem social, se
articula para resignificar o pobre em seus papéis sociais. Desta forma, os
Governos criaram leis que asseguravam a assistência regional do pobre e sua
emancipação local. Dai registram-se em vários países da Europa leis que
determinam as províncias locais a assistir os pobres em suas limitações
(moradia, alimentação, trabalho). A partir deste momento histórico o pobre
deixa de ser um sujeito pré-definido divinamente em seu estado de pobreza, e agrega
a figura de cidadão de direito.
Por volta de 1522 várias cidades da Europa fazem resoluções legais
como medida para enfrentamento da pobreza e inserção dos pobres na sociedade
local. Estas políticas municipais (provincianas) tinham como princípios: “a
exclusão dos estrangeiros, proibição estrita da mendicância, recenseamento e
classificação dos necessitados, desdobramentos de auxílio diferenciados em
correspondência com as diversas categorias de beneficiários” (CASTEL, 1998, p.
73).
O decreto de Moulin, na França, em 1556, é mais um exemplo de
tentativa governamental em prol da reintegração dos pobres na sociedade local,
segue abaixo o artigo 73 do decreto de Moulin (apud CASTEL, 1998, p. 74): “Ordenamos que os pobres de cada cidade,
burgo e aldeia sejam alimentados e sustentados pelos habitantes da cidade,
burgo ou aldeia de que forem nativos os moradores, a fim de que não possam
vagar ou pedir esmola em outros lugares diferentes daqueles em que estão, os
quais pobres devem ser informados e certificados do que é dito acima se, para o
tratamento de suas doenças, forem obrigados a ir aos burgos ou povoações onde
há hospitais centrais e leprosários a isso destinados”.
Uma das primeiras leis assistencialista e de política de bem-estar
social foram as Poor Laws (Lei dos Pobres, também conhecida como Estatuto de 1601). A Lei privilegiava a
assistência a três grupos de indigentes, a saber: os válidos, os inválidos e as
crianças. Os dois últimos grupos recebiam subsídios monetários, mas no primeiro
grupo (os válidos) as províncias tinham a obrigação de socorrê-los e fornecer,
a estes, trabalho (BLASS, 2006). Aqui ainda se percebe um resquício da atuação
da igreja, pois estas ações assistencialistas se davam conjuntamente com as paróquias locais. A Lei dos Pobres começou a ser questionada a partir do crescimento
populacional e por causa das migrações urbanas.
No referido período histórico ainda não havia muitas migrações dos
pobres para as regiões ditas prosperas (como se acentua na segunda metade da
Revolução Industrial). Então, por esta razão era responsabilidade da província
do pobre dar-lhe toda assistência possível numa eventual estado de
desempregabilidade e pobreza. Portanto, era responsabilidade do Estado cuidar
dos vagabundos (nome não pejorativo,
mas denotava aqueles que vagavam) e eventuais peregrinos (reconduzindo-os a
suas pátrias/vilarejos). Sendo assim os pobres eram parte constituinte da
sociedade – eram cidadãos de fato e de direito.
A identidade do pobre se dava a partir de sua historicidade local,
familiaridade e fraternidade coletiva. Por ainda nos referirmos ao período
pré-Revolução Industrial tais características eram notórias. As pessoas tinham
nos vilarejos suas colônias, a terra lhes fornecia tudo que necessitavam para a
sobrevivência, a quantidade de filhos amenizava o ardor da vida rural e ao
mesmo tempo consolidava fraternidades (solidariedade), que se expandiam para
vilarejos próximos. Por esta razão, o Estado entendia que os pobres eram de
responsabilidade regional/local (provinciana).
Obviamente que as províncias não suportariam a pressão da iminente
industrialização e que o pobre seria um entrave nesta nova formatação social de
ordem produtiva. Por esta razão, as leis faziam valer o caráter de cidadania
dos pobres, tentando fortalecer a perspectiva de que o pobre é um cidadão
imergente de um grupo social. Sendo, portanto, de responsabilidade coletiva a
assistência ao pobre. Contudo, o cenário social (cultural) mudaria
drasticamente com o advento do Capitalismo e Revolução Industrial. Tornando o
pobre um ser desconexo com a sociedade local, desprovido de legitimação social
e desmoralizado culturalmente. Legitimiza-se o Capitalismo como Religião levando as pessoas à “casa do desespero”,
como critica Walter BENJAMIN (2013) – texto inicialmente escrito em meados de
1921.
A figura do pobre deixa de ser um tabu religioso teocêntrico, mas
também agora deixa de ser um cidadão com historicidade social-política. O pobre
desfigura-se nestes dois momentos históricos e reconfigura na contemporaneidade
como um ser criminalizado, inferiorizado, desvirtuoso e incapaz. Neste estado
de completa rendição ao capital, o pobre se personifica com ausência de
virtudes individuais, promiscuidade, vadiagem, incompetência, preguiça,
criminalidade e vagabundagem. Como adverte WILLIAMS (2007, p. 28): “O pobre não
é mais visto como um próximo, sendo, então, transformado em estranho, perigoso
e indesejável. Nesse período, o pobre foi identificado com a figura do
vagabundo, que se transforma no elemento central da representação da pobreza e
dos pobres pelas classes dominantes”.
Assim e simplesmente,
Vinicius Seabra | vs.seabra@gmail.com
[escrito em 06 de Novembro de 2014]
::Referências Bibliográficas::
ALBERT, Michel. Capitalismo versus Capitalismo. São
Paulo, SP: Fundação FIDES, 1992.
BENJAMIN, Walter. O Capitalismo como Religião. São Paulo,
Boitempo, 2013.
BLASS, Leila Maria da Silva
(org). Ato de trabalhar: imagens e
representações. São Paulo: Annablume, 2006.
CASSAB, Maria
Aparecida Tardin. Jovens pobre e o
futuro – a construção da subjetividade na instabilidade e incerteza.
Niterói: INTERTEXTO, 2001.
CASTEL, Robert. As metamorfoses da questão social: uma
crônica do salário. Petrópolis, RJ: Vozes, 1998.
DOWBOR, Ladislau. Formação do
Terceiro Mundo. 15 ed. São Paulo: Brasiliense, 1994.
FELTRAN, Gabriel
de Santis. Desvelar a Política na
Periferia: Histórias de Movimentos Sociais em São Paulo. São Paulo:
Associação Editorial Humanitas, 2005.
GIANNOTTI, Vito. História das lutas dos trabalhadores no
Brasil. Rio de Janeiro: Mauad X, 2007.
HARVEY, David. A produção capitalista do espaço. São Paulo: Annablume, 2005.
HOGGART, Richard. As Utilizações Da Cultura –
aspectos da vida cultural da classe trabalhadora. 1° Volume. Lisboa: Editorial
Presença, 1973.
HUNT, E. K. e LAUTZENHEISER,
Mark. História do Pensamento Econômico.
Rio de Janeiro: Elsevier, 2013.
MARTINS, José de Souza. Exclusão
Social e a Nova Desigualdade. 3. ed. São Paulo: Paulus, 1997.
MOLLAT, Michel. Os pobres na Idade Média. São Paulo.
1989.
NETTO, Edméia Corrêa. Profissão:
assistente social. São Paulo: Cultura Acadêmica, 2010.
REZENDE FILHO, Cyro de Barros. Os pobres na Idade Média: de minoria
funcional a excluídos do paraíso. Revista Ciências Humanas. Universidade de
Taubaté (UNITAU), Taubaté, v. 1, n. 1, p. 1-9. 2009.
SCHWARTZMAN,
Simon. As causas da pobreza. Rio de
Janeiro: Editora FGV, 2004.
SUSSEKIND,
Flora. O Brasil não é Longe Daqui: o
Narrador, a Viagem. São Paulo: Companhia das Letras, 1990.
TELLES, Vera da
Silva. Direitos Sociais: Afinal, de Que
se Trata? Revista USP. São Paulo: USP, n° 37, pp. 34-45, mar./maio 1998.
TELLES, Vera da
Silva. Pobreza e Cidadania. São
Paulo: USP, 2001.
TELLES, Vera da
Silva. Pobreza e Cidadania: Dilemas do
Brasil Contemporâneo. Caderno CRH. Salvador: UFBA, vol. 6, n° 19, pp. 8-21,
jul./dez. 1993.
WILLIAMS, Ava Renarda. O Caráter Multifacetado da Pobreza: a
relação entre concepção e intervenção. 2007. 162 f. Dissertação (Mestrado
em Política Social) - Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória, 2007.
ZALUAR, Alba. Integração Perversa: pobreza e tráfico de
drogas. Editora FGV, 2004.